quarta-feira, 25 de março de 2015

Na hora da morte



Vive-se uma vida inteira para no fim acabar tudo assim!
A hora da morte não é o momento para saber como a vida acaba, mas uma oportunidade para ver o que foi a vida. Momentos de dor e momentos de alegria; como se foi capaz (e como nós somos capazes) de acolher e desfrutar do dom da vida. Vale a pena a vida, se somos capazes de a viver. A morte é certa, mas a qualidade de vida depende da capacidade interior para a viver, para a fazer valer a pena.
A vida é um todo. Uma vida bem vivida, plena de doação que termina em pecado mortal, ensinava-se, que era a via para a perdição certa e eterna. Pelo mesmo raciocínio, uma vida não vivida, exalando um contínuo odor a ódio, culminando com o arrependimento, por meio deste, consumava-se na felicidade eterna.
Quem é quem para certificar uma atitude como pecado mortal? (Não é pecado mortal matar em nome de Deus?)
Creio que Deus olha para cada um de nós como um todo. O Senhor conhece o coração daquele que ama o próximo em público e, em família, é egoísta e agressivo; e conhece o coração daquele que exibe uma atitude e uma personalidade de desdém e desinteresse em público e de caridade na intimidade com o outro.
A morte, mais que o fim da vida, a terrena pelo menos, é a manifestação em simultâneo de toda a vida, de todos os momentos, ocultos e conhecidos, pensados e realizados, dos desejos contidos, dos concretizados, dos frustrados. Na morte, poderemos contemplar algo que não é o filme da nossa vida, embora o inclua, mas que é muito mais. As razões e as consequências de cada gesto realizado, de cada acção sofrida, os males causados às outras pessoas e a felicidade que espalhámos. O mal que fizemos e podíamos ter evitado e aquele que não era humanamente possível ter evitado, o bem que fizemos por inevitabilidade e o que deixámos de fazer. Os risos e os choros que causámos.
Antes das discussões, e para nos prepararmos para elas, acerca do Céu, do Inferno, do Purgatório, da condenação e da salvação, devemos reflectir individualmente na vida que estamos a levar, porque na hora da morte, embora seja fácil lembrarmo-nos dela, já não podemos evitar que o que foi feito tivesse sido feito. Com todas as consequências agradáveis e desagradáveis que daí advêm.

Orlando de Carvalho

Sem comentários:

Enviar um comentário