A imagem está propositadamente desfocada
Realizámos um inquérito ao desempenho dos pais no processo
catequético. A amostragem não é significativa para conclusões científicas, mas
é um contributo válido para um dos principais temas que preocupam todos os
agentes da evangelização sistematizada de crianças e adolescentes.
Optámos por um encontro com pais e mães do 6º ano de
catequese, precisamente quando o assunto era já a Profissão de Fé, quase no
final do ano catequético.
Entreguei aos pais e mães presentes a folha a seguir
reproduzida.
Os participantes na reunião correspondiam a 50% das crianças
do catecismo. Este é logo um factor a ter em consideração. No final de seis
anos de catequese, e para tratar de um assunto tão relevante como a Profissão
de Fé, apenas metade das famílias se fez representar.
Sabemos que há casos de pais e mães a trabalhar por turnos e
outras situações óbvias que, no total, não são 50% da população em causa. Com o
inquérito que levámos a cabo não é possível afirmar se este desinteresse
apriorístico dos pais e mães que registámos deriva directamente da atitude
eclesial ou didáctica deles mesmos, se do comportamento dos catequistas e
outros responsáveis, se da comunidade olhada de modo global. Certamente de
todos, mas seria interessante saber o grau em que influiu cada interveniente.
Todavia essa questão tem uma abrangência diferente da que colocamos.
Em Portugal e nos últimos vinte anos, a catequese foi
relativizada, como adiante teremos oportunidade de perceber. Há duas décadas,
quando se marcava uma reunião de preparação para a Comunhão, não faltava
ninguém, salvo, nesses casos sim, por razões de força maior. Todas as famílias
tinham uma veneração, digamos mesmo, por este sacramento. E a Profissão de Fé
surgia logo em segundo lugar no interesse despertado. Teremos sido nós, clero e
agentes de evangelização, a provocar algum relativismo, ao explicar mal que as
roupas brancas ou claras não eram obrigatórias, mas mero costume que não fazia
sentido? Ou com as opções tomadas em relação ao jejum eucarístico, ao
sacramento da reconciliação, à penitência? A situação sacramental dos pais e
mães, por via das novas relações familiares multipessoais? O valor das
respostas a estas interrogações não reside em encontrar os culpados, mas em
descobrir soluções para as falhas que nos afligem.
Este foi o inquérito
que entregámos aos pais e mães.
Este questionário tem o objectivo de melhorar o que fazemos
com as crianças do 6º catecismo. Pedimos a colaboração de mães e pais. As
respostas serão tratadas estatisticamente. Não é necessário identificar-se.
1.
O seu filho ou filha prepara-se para fazer a
Profissão de Fé. Sabe o que é isso? É capaz de o explicar em menos de uma dúzia
de palavras?
2.
Costuma conversar com a sua filha ou filho sobre
o que se passa na catequese?
3.
Já conversaram sobre o significado da Profissão
de Fé? Já perguntou se ele/ela quer fazer a Profissão de Fé?
4.
Costuma incentivar o seu filho/filha a
participar na missa, mesmo que com dificuldades, ou diz-lhe algumas vezes que
se não for, não faz mal, vai na semana seguinte?
5.
Daqui a uns meses, estaremos à espera de si e do
seu adolescente para frequentar a catequese, no 7º ano. Será uma catequese
diferente, já não dirigida a crianças, como até agora. Os catequistas estarão
aqui para continuar a anunciar a mensagem de Jesus Cristo. Esta mensagem é
importante para si? Vai esforçar-se para que o crescimento espiritual do seu
adolescente continue lado-a-lado com a escola e os outros saberes?
Obrigado.
Os catequistas.
Nota: Estas respostas serão tratadas anónima e estatisticamente.
Metodologia
Os inquéritos foram distribuídos no início da reunião e
preenchidos em larga maioria antes de se iniciarem os trabalhos. Em determinado
momento, gerou-se uma discussão, em torno do último quesito, envolvida em
grande polémica e mesmo algum confronto de pais entre si.
Usaremos a palavra pai, daqui em diante com o significado de
‘pai ou mãe’.
Um pai começou por fazer uma intervenção em que afirmou que
dava mais valor à formação espiritual que à escolar; disse que a vida era
possível, ou podia valer a pena, sem formação escolar, mas não sem a
espiritual. E continuou informando que quando havia festas de aniversário de
outros garotos, já se sabia lá em casa, que a brincadeira não podia interferir
com a missa, e que se faziam conciliações, de modo a poder ir a uma e outra.
Outro pai reagiu, algo irritado e explicou que o filho
praticava futebol e que quando havia treino ou jogo, isso era mais importante
que a missa e esta ficava para trás. Nem concebia outra interpretação. E esgrimiram-se
argumentos.
Outro pai explicou que lá em casa era fácil. Uma semana iam
à missa, na outra iam à festa de aniversário, rejeitando a hipótese de
conciliação de horários, partilhada pelo primeiro pai, uma vez que “as crianças
têm que ter tempo para ser crianças”. Outro defendeu que temos que ceder
nalgumas coisas, não podemos “obrigar” sempre a ir à missa. Que se o filho se
queixa que a missa ou a catequese são uma seca, não o pode obrigar a ir. Têm
tempo quando forem mais crescidos…
Análise aos
inquéritos
Na pergunta 1) pedia-se uma identificação da Profissão de
Fé, a festa para a qual as crianças se estavam a preparar, bem como as
famílias, razão de ser da reunião.
Em 33% das respostas, indicaram que servia para aprofundar a
fé ou para confirmar a fé.
Em 42% dos casos, foram capazes de estabelecer uma relação
correcta entre o Baptismo e a Profissão de Fé.
Os restantes 25% responderam que os filhos sabiam o que isso
era.
Analisando, 33% dos pais fizeram uma dedução pela lógica do
sentido das palavras, 25% esquivaram-se a responder por eles mesmo. Enfim,
quase metade dos pais sabia que se tratava de uma renovação dos votos
baptismais já anteriormente realizados por pais e padrinhos. Não estiveram
presentes na reunião os pais de crianças baptizadas tardiamente e que tivessem
proferido elas próprias o compromisso.
Embora nós catequistas saibamos que há uma larga taxa de
pais com quem não existe habitualmente diálogo das crianças sobre o que
acontece na catequese, nem na escola, nem nas outras actividades, 100% dos pais
respondeu à pergunta 2) que conversa regularmente com os filhos sobre o que se
passou no tempo da catequese. Pretendíamos uma ideia do fenómeno nesta
população, em ordem a avaliar as medidas que se podiam tomar para incrementar
este diálogo, mas somos levados a concluir que, qualquer que seja a
percentagem, os que não dialogam não estão abertos a mudar, uma vez que nem
reconhecem o seu comportamento.
O resultado da pergunta 3) pode não reflectir a realidade na
perspectiva que tínhamos em mente. Apenas um pai respondeu que não tinha
conversado com o filho sobre o significado da Profissão de Fé. Pretendíamos
saber se existira um diálogo e uma troca de ideias sobre o assunto. Na
quantidade de “sins” estarão certamente englobados muitos casos em que se falou
em Profissão de Fé mas não acerca da Profissão de Fé.
A outra parte da pergunta referia-se à tomada de consciência
por parte da criança do que ia fazer. Neste tempo pós-conciliar, não
pretendemos mais que alguém faça a Profissão de Fé ou receba qualquer sacramento
para fazer a vontade à família, mas contrariada, nem por tradição, ou para
completar uma etapa da vida (social), ou para atingir um objectivo, porque
pareceria mal não ter esse registo no seu currículo.
Não perguntaram aos filhos se queriam fazer a Profissão de
Fé 17% dos pais.
Foram evasivas 17% das respostas, o que deixa transparecer
que também não colocaram a pergunta aos filhos.
Afirmaram categoricamente que tinham conversado com os
filhos sobre eles quererem ou não fazer a Profissão de Fé os restantes 66% dos
pais. Não os terão certamente confrontado com a decisão:
- E tu, por ti, queres ou não assumir este compromisso?
Mas terão mantido um diálogo onde terá sido expresso que era
essa a vontade dos filhos.
Neste grupo, estava representada uma percentagem
anormalmente elevada de crianças que frequentam a missa porque são membros do
Coro ou porque são Escuteiros. À primeira parte da pergunta 4), 100% dos pais
responderam que incentivam os filhos à participação na missa. Houve quem
admitisse que os filhos tinham que ir à missa porque faz parte da norma
escutista. Já no que se refere à segunda parte, apenas 2/3 confirmam uma
participação regular na missa. Os restantes 33% assumem na resposta ausências
devido compromissos como prática de futebol, saídas da família, e culpas
diversas assumidas pelos pais.
A concluir, à pergunta 5), todos os pais referiram que era
importante a mensagem de Jesus Cristo e saber que os seus filhos eram
aguardados pelos catequistas no ano seguinte. Também 100% declararam
consideraram importante para o crescimento espiritual dos seus filhos.
Ao longo da reunião, tive oportunidade de contrapor algumas
afirmações que foram feitas.
Alguém admitiu que não podia obrigar o filho a ir à
catequese ou à missa contra a sua vontade, se ele se queixava que era uma seca,
porque não tinha autoridade para tal.
Ora, Jesus respondeu a Pilatos que o poder que ele tinha
para o condenar ou o inocentar, provinha de Deus (Jo 19,10-11). Facilmente deduzimos
a proveniência divina do poder paternal, é Deus que deseja que os pais exerçam
o poder para educar e formar os seus filhos, é mesmo um encargo que recebem de
Deus.
A respeito da seca que a missa ou a catequese possam ser (embora
não seja de todo conveniente que isso aconteça), convém notar que para uma
proporção elevada de crianças as aulas de Matemática são uma seca, mas tal não
costuma ser razão para os pais concordarem em que os seus filhos deixam de as
frequentar.
Encontramos boas razões para acreditar que uma boa parte
destas crianças, entretanto adolescentes, receberá o Crisma no 10º ano de
catequese, em consonância com o crescimento espiritual na Fé. Outras chegarão
lá um pouco coxas, mas S. Paulo transmite-nos uma Fé imensa na graça divina que
se sobreporá a todo o mal (Rom 5,20) e não será de admirar que esses que nos
parecem coxos atinjam ainda maior perfeição que os outros. Para isso, os
catequistas continuarão a servir o melhor que forem capazes implorando e
acatando a orientação do Espírito Santo.
Orlando de Carvalho