quinta-feira, 2 de fevereiro de 2017

Reflexão sobre o Conselho Pastoral Paroquial como órgão de corresponsabilidade na Paróquia (II)


 Continuamos a reflexão sobre corresponsabilidade na paróquia. O texto de hoje foi lido em reunião plenária de um Conselho Pastoral e as únicas alterações que sofreu referem-se à eliminação de nomes de pessoas.
Acreditamos que através de situações concretas, que não são as vossas, poderão descobrir muitas semelhanças. Afinal somos todos filhos de Deus, criados para a santidade, mas com dificuldade em nos libertarmos de algum egoísmo pessoal e colectivo.
Identificando com humildade o que a cada um se ajustar, esta reflexão poderá ajudar à edificação e crescimento das comunidades paroquiais a que cada um pertence.

  1. A Igreja de Cristo tem um único Fundador: Nosso Senhor Jesus Cristo! Ele é a única cabeça da sua Igreja. E nós temos o privilégio de ser membros da sua Igreja. Pedras mais vivas ou menos vivas, pobres pecadores, mas bem-aventurados com a graça de pertencer ao povo eleito.
  2. Esta Igreja fundou-a Cristo em quatro momentos fundamentais que caracterizam a própria Igreja: ao lavar os pés aos discípulos, dando o exemplo do serviço e da disponibilidade; ao instituir a Eucaristia, tornando-Se presente até ao fim dos tempos, Ele que conhecia bem a nossa necessidade de ver algo, de sentir, para acreditar; antes de subir para o Pai, ao dar a sua última ordem «Ide e anunciai a Boa Notícia a todas as nações, baptizando-as em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo»; e, por último ao enviar o Espírito Santo para estabelecer a unidade e abrir o conhecimento e o coração dos homens, fomentando e fortalecendo a expressão humana da Igreja de Cristo.
  3. Mas, pergunto eu, se alguns de nós, cristãos, católicos, leigos, baptizados, se perdessem no mar e ficassem numa ilha perdidos. Se aí estabelecessem uma comunidade e, ao longo de gerações baptizassem os seus filhos – porque qualquer um de nós tem capacidade, poder e mesmo obrigação de o fazer – ensinando-lhes as verdades da nossa fé. A eucaristia e o perdão sacramental dos pecados não poderia ter lugar. Então que dizer dessa gente? Seriam cristãos? Seriam Igreja?
  4. Além dos quatro momentos já citados da fundação da Igreja, há um outro. Anterior àqueles e, como ides ver, não menos importante: «Onde dois ou três estiverem reunidos em Meu nome, Eu estarei no meio deles». É isso que realmente faz Igreja: a reunião dos fiéis em nome de Jesus Cristo! Porque se, mesmo durante a celebração da Eucaristia, cada um estiver a pensar em defender os seus interesses pessoais, em lixar o outro que o tramou antes a ele, então eu não sei em que medida podemos falar de Igreja.
  5. A Igreja é também obra da Criação. Jesus veio completar a Lei antiga e penso que ao fundar a Igreja, ao dar continuação ao Resto de Israel, completou também a Criação.
  6. A meta da nossa vida em comunidade paroquial, em Igreja, é mesmo “sermos Igreja”. Termos presente que é Jesus Cristo que está no meio de nós e deixarmo-Lo agir.
  7. A acção do Espírito Santo é fazer a comunhão entre os fiéis, estabelecer uma sã comunicação entre os fiéis, é fazer crescer dentro de cada um de nós o amor pelos irmãos. E o amor começa por ser respeito, delicadeza, gentileza, mesmo nos factos mais simples. Como é possível amar alguém, dar a vida por alguém, quando nem o lugar no autocarro ou no banco da Igreja se é capaz de dar a esse alguém? Quando há Igreja existe unidade, respeito pela dignidade de cada um. Quem ama respeita, é capaz de pedir perdão quando erra, nunca vira a cara. Quem julga que tem sempre razão, que nunca se engana, que não tem desculpas nem explicações a apresentar – na realidade essa pessoa, no seu íntimo, está convencida que é tão santa quanto o próprio Deus e não está a fazer Igreja, mas está a dividir: está a remar contra a acção do Espírito Santo.
  8. Eu tinha vontade de apontar o dedo a factos da nossa vida paroquial que na minha opinião não contribuem para a unidade, antes pelo contrário. Mas, eu não sou mais esperto, nem mais inteligente que vós, nem sou juiz de ninguém além de mim próprio. O que eu vejo, qualquer um vê. Mas faço um convite a todos – eu incluído, claro – para a seguinte reflexão interior: Na minha atitude no Conselho Pastoral, no meu grupo, na nossa comunidade paroquial, afinal estou a defender os meus pontos de vista, ou os pontos de vista do meu grupo, ou a colaborar para todos em conjunto participarmos da obra da Criação e da construção da Igreja, pensando no que é mais útil à comunidade? Estou a ser advogado de mim próprio, ou estou a ser advogado dos mais desfavorecidos, mesmo que seja contra os meus interesses?
  9. Não devo, contudo, deixar de referir que a vida em comunidade só é possível quando cada um respeita todos e outros e cada um dos outros. Isto todos nós sabemos. Isto todos nós afirmamos. Isto todos nós dizemos que cumprimos. Mas, por vezes, mesmo sem nos apercebermos, tratamos os outros como se, porventura, fossem menos importantes que nós. E quero dar um exemplo.
  10. Este Conselho é o órgão pastoral mais importante da Paróquia. Juntamente com o Pároco, claro. Assim, é, do meu ponto de vista, inadmissível que algum conselheiro faça a opção de faltar ao Conselho para estar presente em actividades do grupo que representa aqui no Conselho. E isto acontece com bastante frequência.
  11. Da mesma forma, deliberadamente não respeitarmos o que for decidido pelo Conselho e ratificado pelo Pároco (desde que não seja nenhuma heresia) é também grave atentado à comunhão eclesial.
  12. Igreja é isto. Cristo não quis impingir um modelo de Deus a ninguém para além de um Ser que ama continuamente. Ele disse: façam como eu. Não pediu para si a melhor iguaria, mas aceitou o cálice que o Pai Lhe tinha destinado. Nós, ao contrário, quando estamos convencidos que temos razão, mesmo na coisa mais insignificante, somos capaz de ir às últimas consequências. Ensinamos e apregoamos que somos capazes de morrer pelo nome de Deus e rezamos a pedir o perdão, da mesma maneira que perdoamos a quem nos tem ofendido, mas não deixamos passar a menor ofensa sem responder à letra, sem nos pagarmos.
  13. E no dia-a-dia é a mesma coisa. Ouvimos dizer na rádio para poupar a água durante dois ou três dias porque houve uma avaria no sistema. E corremos logo todos a encher tachos e banheiras: os outros que se lixem, eu não posso ficar sem água. Porque, afinal, os outros certamente estão a fazer a mesma coisa, pensamos...
  14. Eu próprio, ainda há uma semana estive para bater, mais ou menos deliberadamente, num membro deste Conselho, porque ele me ofendeu. Na minha opinião gravemente. Deus – quem sabe se por causa da oração de alguém que sabia o que eu ia fazer – trocou-me as voltas. Também não sou santo, como gostava. Sou de certeza muito mais pecador do que desejava ser.
  15. Não vale a pena estarmos aqui se não tivermos como primeiro propósito servir os outros.
  16. E mostrarmos uns aos outros e cada um a si mesmo que estamos aqui em nome de Jesus. Não chega os elementos do Conselho Pastoral encontrarem-se três vezes por ano, nessa condição discutir umas ideias, se a procissão é no dia 17 ou no dia 24, e pouco mais. Este Conselho como núcleo paroquial tem que ser exemplo. Convém comermos algumas refeições juntos. Convém ainda mais termos alguns momentos de oração juntos. Para além da Eucaristia dominical. E sem a exigência de um dia ou de um fim de semana de retiro. Aumentar, de vez em quando, duas horas ao Conselho: uma para jantar ou almoçar, outra para rezar. Comunitariamente. Não faz muito sentido o senhor prior vir aqui dizer que não estavam muitos membros do Conselho na Abertura do Ano Pastoral – eu próprio também não estive – , mas que não faz mal, o que interessa é que o ano está a arrancar bem. Eu não acredito que o que começa mal comece bem. Se já está marcado o encerramento do ano pastoral, então que se providencie, nós todos em conjunto, o que se vai fazer, como se vai fazer, e assumamos as nossas responsabilidades. E tenhamos a humildade de não andar à procura dos que não foram, porque a realidade de cada um é muitas vezes uma história entre ele e Deus. Esforcemo-nos cada um por dar o melhor de si e de desculpar os que não puderem dar assim tanto.
  17. Volto a repetir o que venho dizendo há muito tempo. Há muitas crianças no nosso espaço paroquial que não vêem à catequese porque ninguém vai lá á casa falar da catequese de Jesus. Por favor, irmãos, isto é demasiado importante para que alguém o possa ouvir e fazer como se não tivesse ouvido. Se gostamos de saborear o conhecimento da vida na Igreja de Jesus, não temos o direito de ser egoístas e de guardar isso só para nós, temos que partilhar com os outros, ir buscar essas crianças e trazê-las para que também elas gozem da alegria da vida nos sacramentos da Igreja.
  18. Continuo a pensar que há um grande desconhecimento da realidade da nossa comunidade paroquial. Desconhecemos o que os outros grupos fazem. Desconhecemos os Estatutos deste Conselho, o que é, ou quem é o Secretariado Permanente, ou o Conselho Económico, quais são os órgãos do Centro Social. Em tempos propus a actualização dos Estatutos deste Conselho. Decidiu-se que o Secretariado permanente ia tratar disso. Claro, que não tratou. Não faz sentido ter uns Estatutos que a maior parte desconhece e que acabam por não ser cumpridos.
  19. Não podemos vir para aqui discutir o sexo dos anjos. Acredito que se estamos aqui é o próprio Espírito Santo que nos convoca, mas para trabalhar.
  20. Acreditem, ou não, no diabo, a verdade é que ele acha muito mais interessante atacar e dividir numa paróquia como a nossa que numa paróquia em que há apenas um grupo de 3 ou 4 pessoas a colaborarem com o pároco que vai lá quando calha. Porque na nossa Paróquia há divisão para fazer, há maledicência para provocar. Por somos uma Paróquia estruturada, com muitas pessoas a intervir. Vale a pena ao diabo investir em dividir e provocar mal estar. Por isso, temos que ter maior cuidado a preservar aquilo que temos em cuidar de um espaço apropriado para o Espírito Santo viver e reinar na nossa Igreja.
  21. Vou concluir. Proponho que Jesus Cristo seja sempre o primeiro em cada um dos nossos grupos. Proponho que em vez de responderem já: mas Jesus Cristo é já o primeiro no meu grupo, que façam uma reflexão sobre isto. Proponho aos nossos presbíteros, especialmente ao nosso pároco que se empenhe com a maior determinação na unidade (que é expressão da presença do Espírito Santo) paroquial. Não esquecendo a Eucaristia. Os paroquianos têm que convergir nas nossas missas e não nas das paróquias vizinhas, ou em nenhuma paróquia. Vamos empenharmos na programação que fizermos em levar um conhecimento mais profundo do Senhor, em primeiro lugar a nós próprios, em segundo lugar aos que já participam mais ou menos activamente na vida paroquial e depois, mas não menos importante, pelo contrário, aos que estão esfomeados da Palavra, dos Sacramentos e do nome do Pai do Filho e do Espírito Santo.

 

Continuação da exposição apresentada em Conselho Pastoral em Julho de 2003

Orlando de Carvalho




2 comentários:

  1. Subscrevo quase na íntegra. Um senão: as pessoas podem mudar o coração mas leva tempo. Um dia disseram-me num retiro de catequistas que "não queiramos fazer os outros à nossa imagem e semelhança ... porque cada pessoa tem o seu ritmo de caminhar". Tenho visto que é assim mesmo. Se tivessemos grupos perfeitos, comissões perfeitas ... seríamos anjos e santos. Mas somos apenas homens e mulheres pecadores em caminhada e temos de ser pacientes uns com os outros; perdoar para sermos perdoados e continuar. O maior erro, por vezes, é voltar as costas porque não se concorda com isto ou com aquilo. Os que ficam são mais fortes do que os que desistem. Devemos ser perfecionistas, sim, mas respeitar as limitações de "quem é chamado" que nem sempre são aqueles que pensamos serem os melhores:- "Não fostes vós que me escolhestes, diz o Senhor. Fui Eu que vos escolhi e vos destinei para que deis fruto...". Não somos Deus. Somos cristãos e criaturas imperfeitas, incluindo o padre. Revestidos da "vocação e missão" estamos revestidos de Cristo e é desse Cristo que o cristão deve procurar dar testemunho - segundo o seu ritmo-! Mais vale esperar que uma porta se abra do que arrombá-la! É assim a paciência de Deus!

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    1. Completamente de acordo. Não foi fácil as senhoras desabituarem-se de usar sempre véu para entrar na igreja, depois do Concílio. Vai-se fazendo caminho, como diz. Obrigado.

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