quarta-feira, 7 de fevereiro de 2018

As sandálias de Francisco





Ao observar mais um conjunto de obras de arte do Vaticano, novamente veio à minha presença o filme marcante de uma época, de um modo de pensar e da apresentação de uma nova teologia, ou da recuperação da antiga teologia: 
Um padre oriundo do gelado bloco soviético e que tinha atravessado a guerra e a ditadura repressiva sentou-se na cadeira de São Pedro e, num formidável ambiente dramático, acabava por dar a ordem para que as obras de arte de toda a Igreja fossem vendidas para alimentar uma população em vias de morrer à fome e assim evitar um conflito mundial. Creio que o filme estreado em Dezembro de 1968, e enriquecido pela interpretação de Anthony Quinn, no papel de Papa, jamais poderá ser esquecido por quem o visto nessa época premonitória.
Dez anos mais tarde, quando São João Paulo II foi eleito Papa, esses que tinham visto o filme questionaram-se: Será que, para além de ser um papa inesperadamente chegado do frio, haverá mais concordâncias deste pontificado com o filme?
Deparamos agora com a realidade do pontificado de Francisco e percebemos que já nada nos espantará em relação à capacidade de a Igreja, ao mais alto nível, assumir o único e verdadeiro mandamento evangélico. No dia em que o Papa Francisco quiser dar vida às palavras de Jesus em mais este aspecto, muito mudará na Igreja e na Humanidade.

Quando Jesus Se pôs de novo a caminho, um homem aproximou-se a correr, ajoelhou-se diante d'Ele e perguntou: «Bom Mestre, que devo fazer para herdar a vida eterna?» Jesus respondeu: «Porque Me chamas bom? Só Deus é bom, e ninguém mais. Conheces os mandamentos: Não mates; não cometas adultério; não roubes; não levantes falso testemunho; não enganes; honra teu pai e tua mãe». O homem afirmou: «Mestre, desde jovem tenho observado todas essas
coisas». Jesus olhou para ele com amor e disse-lhe: «Falta-te só fazer uma coisa: vai, vende tudo, dá o dinheiro aos pobres e terás um tesouro no Céu. Depois vem e segue-Me». (Mc 10, 17-21)

Se se pretendesse vender toda a riqueza artística da Igreja, certamente não haveria dinheiro suficiente no mundo para a comprar. E se nessa fortuna estão incluídas obras piedosas, sabemos que muitas outras são mesmo de natureza pagã e sem enquadramento teológico no espólio eclesial. Essas apenas podem ser consideradas peças de museu, fonte de receita através dos visitadores de museus e de alimento para algum sentimento de poder e riqueza.
Quanto bem podia fazer a Igreja vendendo essas obras pagãs? Que ensinamento evangélico poderia resultar dum gesto dessa natureza?
Por outro lado, quanta oposição se levantaria por parte de altas dignidades da Igreja, mais agarradas ao mundo que ao Espírito? Quantos cardeais afrontariam e desafiariam cara-a-cara o Papa, numa arrogância plena de soberba? Quantos conservadores moralistas com altos títulos e cheios de privilégios não inventariam argumentos diabólicos para combater tal decisão? Quantos desses, também corruptos, não tentariam falsificar as negociações de modo a ficarem com boa parte do dinheiro realizado com tais vendas que eles apenas fingiam abominar?

Permiti-vos, Espírito Santo, pairar sobre a Igreja de Cristo e derramar sabedoria e caridade no coração e na cabeça do nosso Papa e dos vossos fiéis. Que a devoção não seja corrompida pela ganância. Que o pão nosso de cada dia possa chegar a todos os filhos do nosso Pai que está nos Céus, que são todas as criaturas humanas. Que a Igreja seja fonte de caridade e, pelo seu testemunho, as nações e as gentes caminhem verdadeiramente para Jesus, Porta do Reino dos Céus.

Orlando de Carvalho

Mais algumas obras de arte dos museus do Vaticano que poderiam ser bem vendidas sem dano para a devoção cristã




                  


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