Alguém me recordou um versículo do Evangelho segundo São
João, escrito numa perspectiva completamente nova:
"o único paramento
explicitamente referido, na última ceia, é a toalha que Jesus põe à cintura,
com a qual enxagua os pés aos discípulos" (Jo 13,4)
Quando olho o teólogo e ex-padre
Leonardo Boff, não vejo um dirigente ou inspirador da Teologia da Libertação. Vejo
um católico baptizado e, por isso, sacerdote. O seu cachecol é na realidade uma
estola, às riscas coloridas, que poderia ser usada por um rabi. Estolas muito
semelhantes foram usadas durante o Grande Jubileu do ano 2000 e nas Jornadas
Mundiais da Juventude de Paris. Não tem debruados a ouro nem prata, mas as
cores do Arco da Aliança desenhado por Deus nos céus quando fez a sua Aliança
com Noé.
Habituei-me durante muitos anos a
participar em missas em que padres dominicanos usavam muitas vezes uma estola
sobre a alva ou túnica branca. Apenas. Jesus não se confundia com os saduceus,
fariseus ou romanos, mas sabemos que não era fácil distingui-lo e encontrá-lo
no meio do povo, pois por várias vezes o quiseram agarrar para lhe fazer mal e
ele desaparecia no meio do povo.
O sacerdote não se impõe pelas suas
vestes ou outros símbolos, mas pela autoridade com que anuncia o Evangelho. Autoridade
que quando é verdadeira é inegável, para baptizados ou não baptizados, adultos,
crianças ou anciãos.
No tempo de crise pandémica que se
vive nestes tempos, as igrejas estão forçadamente fechadas para evitar
aglomerações de pessoas e contágio da doença, mas a verdadeira Igreja está
sempre com as portas abertas, como o Pai está sempre de portas abertas para
abraçar todos os filhos, mesmo os mais marotos.
Que os ministros ordenados evitem
toda a opulência ou sinal menos sóbrio nas transmissões das celebrações
dominicais e outras, seja através da televisão ou da Internet. Os santos, isto
é, os baptizados, precisam de escutar palavras de consolação, palavras ditas
com ternura e autoridade, e não de ver algo que lhes possa parecer mais
relacionado com tentativa de imposição de um poder que, de facto, talvez nem
exista.
Cristo ensinou-nos a cuidar dos mais
débeis, ladrões, prostitutas, o próprio Judas seria de uma seita muito
semelhante ao que hoje denominamos de movimento terrorista.
Jesus não trata as pessoas por
adjectivos, como o Pai também não o faz, mas pelos nossos nomes, e somos
olhados por Deus em função do que o nosso coração nos manda fazer e não da
nossa posição social, política ou familiar. Só o Evangelho pode guiar a vida de
um santo e é desta forma que no Livro dos Actos dos Apóstolos são denominados
os seguidores de Cristo.
Sejamos, pois, santos, não por termos
recebido água na cabeça quando éramos bebés, mas por nos darmos aos irmãos
necessitados. Sem catalogar ninguém. Para que também Deus não use um catálogo
quando estivermos na sua divina presença, mas nos abra os braços, nos acolha e
nos perdoe, perdoe muito.
Orlando de Carvalho
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