Vive-se uma vida inteira para no fim acabar tudo
assim!
A hora da morte não é o momento para saber como a
vida acaba, mas uma oportunidade para ver o que foi a vida. Momentos de dor e
momentos de alegria; como se foi capaz (e como nós somos capazes) de acolher e
desfrutar do dom da vida. Vale a pena a vida, se somos capazes de a viver. A morte
é certa, mas a qualidade de vida depende da capacidade interior para a viver,
para a fazer valer a pena.
A vida é um todo. Uma vida bem vivida, plena de
doação que termina em pecado mortal, ensinava-se, que era a via para a perdição
certa e eterna. Pelo mesmo raciocínio, uma vida não vivida, exalando um
contínuo odor a ódio, culminando com o arrependimento, por meio deste,
consumava-se na felicidade eterna.
Quem é quem para certificar uma atitude como pecado
mortal? (Não é pecado mortal matar em nome de Deus?)
Creio que Deus olha para cada um de nós como um
todo. O Senhor conhece o coração daquele que ama o próximo em público e, em
família, é egoísta e agressivo; e conhece o coração daquele que exibe uma
atitude e uma personalidade de desdém e desinteresse em público e de caridade
na intimidade com o outro.
A morte, mais que o fim da vida, a terrena pelo
menos, é a manifestação em simultâneo de toda a vida, de todos os momentos,
ocultos e conhecidos, pensados e realizados, dos desejos contidos, dos
concretizados, dos frustrados. Na morte, poderemos contemplar algo que não é o
filme da nossa vida, embora o inclua, mas que é muito mais. As razões e as consequências
de cada gesto realizado, de cada acção sofrida, os males causados às outras
pessoas e a felicidade que espalhámos. O mal que fizemos e podíamos ter evitado
e aquele que não era humanamente possível ter evitado, o bem que fizemos por
inevitabilidade e o que deixámos de fazer. Os risos e os choros que causámos.
Antes das discussões, e para nos prepararmos para
elas, acerca do Céu, do Inferno, do Purgatório, da condenação e da salvação,
devemos reflectir individualmente na vida que estamos a levar, porque na hora
da morte, embora seja fácil lembrarmo-nos dela, já não podemos evitar que o que
foi feito tivesse sido feito. Com todas as consequências agradáveis e
desagradáveis que daí advêm.
Orlando de Carvalho
Sem comentários:
Enviar um comentário