terça-feira, 28 de abril de 2015

Síntese das reflexões feitas nas comunidades do Patriarcado em preparação para o Sínodo 2016. Parte I


Foi publicada uma síntese das reflexões feitas nas comunidades do Patriarcado sobre a primeira parte da exortação Evagelii Gaudium, realizadas entre Outubro e Dezembro de 2014. Transcrevemos*.



O primeiro capítulo da Exortação Apostólica Evangelii Gaudium foi lido e meditado por vários milhares de pessoas do Patriarcado de Lisboa no âmbito da caminhada sinodal encetada em Outubro de 2014, rumo ao Sínodo Diocesano a realizar no ano de 2016. A presente síntese do relatório final do primeiro trimestre pretende apresentar as linhas gerais que foram reflectidas.



1. Constatações

As constatações dividem-se entre externas e internas, reflectindo, as primeiras, o olhar dos cristãos sobre o mundo e, as segundas, a auto-analise dos fiéis cristãos em relação à própria Igreja, em vários níveis.

Do ponto de vista das constatações externas, a reflexão identificou muitos aspectos que marcam o mundo dos nossos dias, mundo esse em que todos os cristãos estão envolvidos e de que fazem parte. Por um lado, identificaram-se aqueles aspectos que marcam as pessoas e a sociedade de uma forma mais negativa: o materialismo, o relativismo, a existência de preconceitos, o indiferentismo, o consumismo, o individualismo (e correlativamente a solidão), a ausência da questão sobre Deus, desconfiança generalizada quer em relação aos indivíduos quer em relação às instituições (incluídas nestas o Estado, a própria Igreja, mas também as instituições de base como o casamento e a família). Por outro lado, também se identificaram sinais positivos que surgem no mundo: procura da fraternidade, da interajuda, várias formas de voluntariado, sede de vida espiritual. Neste sentido, teve bastante relevo a leitura que os cristãos fizeram sobre os problemas sociais e culturais que se vivem no Patriarcado de Lisboa, nomeadamente as questões postas por uma sociedade plural, constituída por pessoas de diversas proveniências, e ainda as questões sociais mais prementes, relacionadas sobretudo com as pessoas mais fragilizadas, nomeadamente os idosos. Uma palavra central nesta reflexão foi a «desumanização», sensibilidade que percorre todos os sectores da sociedade.

Quando os cristãos dirigiram o olhar para si mesmos e para a Igreja como todo, assinalaram uma falta de fé generalizada e um desajuste muito grande entre aquilo que a Igreja ensina e a vida concreta dos baptizados. Outros aspectos assinalados visaram uma auto-reflexão ao estilo de exame de consciência, assinalando-se a facilidade para a crítica gratuita, a falta de disponibilidade para a correcção fraterna, a facilidade em fazerem-se juízos de valor sobre as pessoas e, ainda, uma forte tendência legalista e moralista. Referiu-se ainda a falta de conhecimento da Bíblia.

Identificaram-se também algumas dificuldades de forma objectiva em relação à capacidade de partir em missão: a falta de conhecimento sobre o modo de anunciar, a acomodação, o medo de ir só, o descrédito dos resultados, a falta de consciência da necessidade da evangelização e a indiferença. Como pano de fundo, muitas respostas identificaram a mundanidade, tal como descrita pelo Papa, como um dos aspectos marcantes da vida eclesial. Neste sentido, referiu-se ainda a dificuldade em transpor a mensagem cristã para o dia-a-dia e para os problemas de hoje.

Por outro lado, constatou-se ainda que a Paróquia continua a ser o grande campo de trabalho pastoral, com todos os desafios e apelos que isso traz, reconhecendo-se ainda a grande vitalidade dos movimentos para a Igreja de hoje.

Uma grande parte das respostas visava a necessidade de articulação entre estas duas realidades (paróquia e movimentos). O âmbito diocesano também foi visado na reflexão dos cristãos de Lisboa, sendo referido como essencial mas como realidade ainda a construir e a desenvolver.



2. Desafios

Os desafios foram analisados a partir das três funções principais da Igreja: a função sacerdotal; a função profética e a função real.

Do ponto de vista da função sacerdotal, onde se incluíram dimensões como a liturgia, a espiritualidade e os sacramentos, as respostas visaram vários aspectos, sendo de destacar a necessidade de uma formação espiritual mais profunda dos leigos, o que só se conseguirá com uma formação espiritual grande dos padres; a importância da confissão e a necessidade de ser disponibilizado mais tempo para este sacramento; a necessidade de se aplicarem de forma igual os critérios para a administração dos sacramentos, acabando com as disparidades de paróquia para paróquia.

O principal desafio colocado na função profética da Igreja é a sua renovação, rumo a um anúncio mais completo e abrangente de toda a vida das pessoas, e assim menos polarizado em poucos aspectos que por sua vez são absolutizados. Neste sentido, indicou-se também uma necessidade de renovação na comunicação eclesial, quer ao nível dos conteúdos, quer do vocabulário, assim como a sua adequação aos destinatários. Neste campo tem muita importância a utilização das novas tecnologias, que devem ser aproveitadas como veículos de evangelização.

Este aspecto foi assinalado a respeito, muito especialmente, da catequese. Por outro lado, as respostas dadas na caminhada sinodal indicaram a necessidade de acabar com homilias mal preparadas, quer por serem improvisadas, ou de fraca qualidade espiritual, mas também demasiado longas e imperceptíveis. Identificou-se ainda uma grande necessidade de um «primeiro anúncio» em muitas paróquias, ao qual devem estar articuladas estruturas que sirvam de garantia e sustento para a vivência daqueles que escutaram o apelo do Senhor. Por fim, identificou-se também a grande necessidade de fazer das igrejas espaços de acolhimento de todas as pessoas.

No âmbito da função real da Igreja, assinalou-se, de forma geral, a necessidade de uma maior proximidade dos padres às comunidades, realizando pontes entre os vários grupos da paróquia ou mesmo a nível inter-paroquial. Identificaram-se também muitos desafios na pastoral familiar (nomeadamente na preparação para o matrimónio e na pastoral de pessoas em situação irregular), na pastoral social (especialmente sobre o modo de a tornar lugar de evangelização), na pastoral da saúde (sobretudo sobre o modo de integrar os doentes na vida eclesial),na administração paroquial (de modo particular a necessidade de integração dos leigos), entre muitas outras dimensões da vida eclesial.

* Corrigimos gralhas sintácticas e eliminámos as adaptações que o texto tem originalmente ao malfadado Acordo Ortográfico. A Igreja é normalmente um depósito cultural.

Orlando de Carvalho

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