As comunidades básicas africanas e europeias são diferentes.
As diferenças culturais são muito mais que a pigmentação da pele e outras
características anatómicas e fisiológicas. Todas as pessoas são igualmente
criadas e amadas por Deus Criador e o direito reconhece a todos a igualdade em
direitos e deveres. Mas, logo nesse reconhecimento, ao contrário da Bíblia
judaico-cristã, que afirma que Deus os criou homem e mulher, a Declaração
Universal é dos Direitos do Homem! No masculino.
A cultura de um povo, a sua alma, tem a ver com o clima, com
a disponibilidade de alimentos e outros factores intrínsecos ao local que
habita. Mesmo os nómadas estão adaptados à imprevisibilidade e variabilidade
destes factores.
Os africanos têm um ritmo diferente dos europeus que se
revela nos gostos e nas interpretações musicais.
Povos diferentes têm conceitos diversos acerca do valor da
vida.
Na Europa uma criança órfã é um peso para a sociedade. Actualmente
há sistemas de segurança social e apoio à infância que se substituem aos pais
naturais em caso de morte ou de impossibilidade de exercerem as suas
obrigações. Ainda assim, trata-se de processos muitas vezes morosos e
complexos. Se há dinheiro envolvido, é fácil dentro da família tratar da adopção,
mas quando não é o caso, tudo se pode tornar mais difícil. E a adopção é um
processo parcial, nem sempre honesto relativamente à criança desamparada. Quem quer
adoptar uma criança deficiente? Ou um grupo de quatro irmãos? Não obstante os
casos daqueles que acham muita graça adoptar uma criança preta ou asiática…, apenas
pela graça de exibição. O processo é desonesto do ponto de vista da criança
quando os adoptantes e as comissões de adopção acabam por usar e permitir o uso
de métodos eugénicos: adopção dos mais bonitos, dos mais perfeitos, exclusão
dos feios e imperfeitos.
Em África, e temos de olhar para as comunidades de base, as
tribos em África, as aldeias na Europa dos séculos passados, a questão da
adopção não existia. A família era a tribo e cada família era grande. Os órfãos
ficavam naturalmente com um tio, ou um irmão que já tivesse constituído família.
Estas foram as regras gerais e maioritariamente seguidas. Na
actualidade, quase não há aldeias na Europa e em África é enorme a quantidade
de órfãos originados pela ganância de africanos corrompidos e vendidos aos
interesses dos estrangeiros que melhor os subornam e originados pelos interesses
das potências económicas e políticas estrangeiras que mergulharam o continente
em imensa guerra global. Os dados culturais alteraram-se. A memória do povo
esvai-se.
Quando ouvimos falar no direito à adopção, há razão para
ficarmos atónitos. Ouvimos esta expressão incrível a propósito do direito à
adopção por pares homossexuais. Direito! Direito? Que direito?
Nunca se ouvira falar no direito das pessoas adoptarem,
porque isso não é um direito. Aliás, como nunca se consagrou o direito a ter
filhos, ser pai ou ser mãe. Porque são coisas da Natureza que podem suceder ou
não. Mas também se fala do direito a ser mãe ou pai, não do prazer em sê-lo,
mas do direito. Como se os doentes tivessem direito a serem pessoas sãs. Só mentes
distorcidas ou mal formadas ou mal informadas podem falar em direitos nestas situações
em que nos referimos à precariedade e imprevisibilidade da vida. Todo o ser
humano terá direito a cuidados de saúde (amar o próximo), mas a não adoecer…
O direito à adopção existe, de facto, mas à maneira das tais
sociedades africanas. A criança órfã ou sem pais capazes tem o direito a ser
acolhida. Em primeiro lugar por familiares próximos, depois pela comunidade. Nenhum
homem, nenhuma mulher, nenhum casal tem direito a que se inventem crianças para
eles adoptarem.
A adopção é um direito da criança, não um direito de adulto
algum. A Declaração dos Direitos da Criança, promulgada pela ONU, refere que “A
sociedade e as autoridades públicas têm o dever de cuidar especialmente das
crianças sem família e das que careçam de meios de subsistência”. Não existe no
texto palavra alguma com o étimo de “adopção”.
Mais importante ainda é o facto de a existência das duas
situações reconhecidas como “direito” é inconciliável. O direito da criança a
ser adoptada e o direito do adulto a adoptar. Mais ainda quando o adulto quer
ser pai ou mãe como se fosse ao supermercado comprar uma garrafa de whiskey que
pode beber, devolver ou trocar, como se comprasse um carro de luxo para exibir
aos amigos, como se adquirisse uma casa onde pudesse desfrutar de conforto para
a vida. Até ao alvor do século XX, as crianças não era ainda consideradas
pessoas no sentido jurídico da palavra, não tinham direito de pessoas adultas,
nem específicos de crianças. Tal como as pessoas de pele escura e as mulheres,
eram em muitos casos mão-de-obra barata e nada mais que isso. Esta situação
tende a repetir-se em moldes de aparência benemérita ou de direito com a legislação
e a propaganda que os progressistas do costume, isto é, os falsos progressistas,
que apenas são capazes de olhar para o seu umbigo, estão a desenvolver.
Augusto Gil questionava Deus, mas não será que é a nós que
nos devemos interrogar?
Mas as crianças, Senhor, porque lhes dais tanta dor?!… -
escreveu o poeta. Eu modifico a frase: Mas as crianças, criaturas adultas, porque
lhes dais tanta dor?
Orlando de Carvalho