O casamento é
normalmente entendido como um contracto entre duas partes, um homem e uma
mulher.
Como qualquer
contracto, os seus termos e manutenção dependem da vontade das partes. Que são
duas. Um contracto entre duas partes mantém-se enquanto for do mútuo acordo. Se
eu entender denunciar o contracto com o meu fornecedor de água ou de
electricidade, o contracto deixa de existir, bem como as obrigações mútuas
entre mim e o fornecedor. Ele não tem que me fornecer mais energia eléctrica,
ou água, e eu não tenho mais que pagar. Da mesma maneira que eu, também o
fornecedor de água ou electricidade poderia suspender sem razão o meu
fornecimento. Coisa que todos concordamos que seria injusto, mesmo desumano.
Essa situação é normalmente prevista na lei: o fornecedor de água e o da
electricidade não podem sem razão prevista na lei suspender o fornecimento.
Afinal, neste contracto que existe entre mim e a empresa que me fornece electricidade
não somos apenas dois: além de mim e da empresa fornecedora, está o Estado com
o seu poder legislativo, executivo e judicial para fazer valer o contracto em
todo o seu tempo de vida.
A diferença entre o
casamento que é uma instituição natural na sociedade humana e o matrimónio, que
é o mesmo casamento natural com a chancela de sacramento celebrado na Igreja é
justamente o número de contraentes.
O casamento como
instituição natural é celebrado entre um homem e uma mulher. Sabemos que desde
tempos muito antigos as comunidades em que os noivos viviam sentiram a
necessidade de testemunhar esta união, assinalando o casamento com festas em
que participavam as famílias e comunidades a que pertenciam os noivos.
A importância do
casamento como marco instituinte da família, a mais pequena porção da
sociedade, revestiu, a partir de certo momento a celebração do casamento de
carácter religioso: a presença do divino. As pessoas, em diversas culturas
distribuídas pelo planeta e sem se relacionarem, entenderam que a união
fundadora de um homem e uma mulher tinha algo de sagrado.
O chamado registo
civil surge historicamente numa terceira etapa e muito posterior, é uma
novidade em termos históricos. Surge primeiro o casamento instituição natural,
depois o casamento celebrado religiosamente e só finalmente o registo civil,
que vem oficializar perante a administração do Estado uma situação natural, com
ou sem registo religioso.
Ora, o matrimónio
não é um contracto celebrado entre duas partes, mas entre três partes. Por
isso, é um sacramento. Talvez por culpa da própria Igreja, esta particularidade
não tem sido enfatizada devidamente. Realizam-se festas nos templos católicos
sem a noção do que se está a fazer. Como se se estivesse a oficializar uma
união natural ou um registo civil, mas numa igreja, com um padre devidamente
paramentado, com a facilidade de obter lindas fotografias com a arte da igreja
por fundo, mais a decoração de flores que os noivos tratam de encomendar.
É preciso explicar
às pessoas que recorrem ao casamento religioso, isto é, que pedem à Igreja o
sacramento do matrimónio, o que estão a fazer. Pois, sabemos que existem cursos
de preparação para o matrimónio, mas também sabemos que as pessoas os
frequentam e depois agem como se não os tivessem frequentado, agindo em
desconformidade com os mesmos. Chegam a separar-se definitivamente depois de
algumas semanas de casamento, menos que aquelas que despenderam a frequentar o
curso de preparação para o matrimónio. A que se deverá isso?
Deve ser ensinado
aos noivos que pedem à Igreja a bênção para o seu casamento que este só deve
ser celebrado se estiverem dispostos a seguir determinadas regras. Bem, uma
regra é suficiente: amarem-se um ao outro como Jesus amou, ensinou a amar e
continua a amar.
Quando uma pessoa
declara que já não ama o cônjuge… essa pessoa não devia ter casado, pois
comprometeu-se a esse amor por toda a vida. Se a razão desse cessar de amar
for, por exemplo, infidelidade ou maus tratos, a situação é a mesma: é o outro
cônjuge que não devia ter casado se não estava preparado para manter o
compromisso de amor até à morte.
Para casar não é
necessário estar apaixonado, basta amar. É natural e bom que seja um amor
especial, diferente do amor entre irmãos ou entre pais e filhos, mas tem que
existir amor, aquele amor que é doação da sua própria pessoa ao cônjuge. O que
significa ser paciente com o outro e aceitar as falhas do outro. Sendo que isto
tem de suceder nos dois sentidos.
Voltemos ao
contracto. No sacramento do matrimónio, os contraentes não são dois, são três.
O homem, a mulher e Jesus. Isto devia ficar bem inculcado nas cabeças e nos
corações do casal, o que não devia ser difícil uma vez que chegam a ser
celebrados casamentos no decorrer da missa em que ambos os noivos comungam.
Ora, em termos
humanos, um contracto a três reveste características diferentes de um contracto
a dois. Não porque isso se possa reflectir numa votação entre os contraentes,
não vamos tão longe, mas porque em caso de discordância devem ouvir-se as três
partes envolvidas. O marido, a mulher e Jesus.
Isto não é tão
teórico como pode parecer. Mas precisa ser mais bem explicado aos noivos em
particular e a todos os fiéis em geral.
Vem-nos à memória
uma situação que um amigo[1]
relatou e que é uma boa dica para dar amplitude visual ao princípio de que
vimos falando: a presença de Jesus como terceiro parceiro do casamento
sacramento.
O ritual do
casamento católico em Siroki-Brijeg[2]
é diferente. Mas podia deixar de o ser se fosse adoptado nas outras comunidades
católicas. A começar na de cada um. Se cada sacerdote ou diácono, ao presidir a
um casamento, ou se cada casal de noivos ao celebrar o seu casamento, quisesse
fazê-lo à maneira dos habitantes de Siroki-Brijeg, podíamos mudar o conceito de
casamento, a vivência familiar, o mundo.
Em Siroki-Brijeg não
há divórcios.
Vamos descobrir
porquê.
No dia do casamento,
os noivos chegam à igreja e levam com eles um Crucifixo. Tal como as alianças
são benzidas durante a cerimónia, como elemento essencial, também o Crucifixo é
benzido.
As promessas mútuas
são proferidas com a mão do noivo sobre a mão da noiva e a desta sobre o Crucifixo.
O sacerdote coloca as suas mãos sobre as dos noivos, trazendo a bênção da
Igreja a esta união 'a três'.
A promessa de
permanecerem juntos até ao fim da vida, amando-se e auxiliando-se é tripartida:
ele, ela e Jesus. A Igreja, por seu lado, assume também o compromisso de dar
caridosamente todo o apoio à jovem família nascente. Porque a bênção não é, não
pode ser, palavra morta, mas vivência dinâmica. Pela presença do ministro
sagrado, a Igreja assume a representação física de Jesus, participando nas
promessas de fidelidade, nas alegrias, tristezas, saúde, doença, pobreza,
riqueza.
O padre ou diácono
diz então algo do género:
- Encontrastes a vossa cruz. É uma cruz para amar, mantê-la sempre convosco,
uma cruz de que não vos apartareis até que a morte vos separe, que guardareis
com ternura gravada nas vossas próprias almas.
O Crucifixo guardado em casa, em local visível e onde
seja fácil reunir para o venerar será o coração do amor do lar que se vai
iniciar, a Fonte de bênçãos e amor naquele casal e na família que eles vão
originar.
Os noivos beijam as alianças. Beijam o Crucifixo. As
alianças simbolizam a aliança que acabam de subscrever. O Crucifixo simboliza a
presença real de Jesus que eles pedem: a omnipresença de Deus no seu casamento
para sempre. Se um deles olhar para outra pessoa, pondo em causa a fidelidade
conjugal, estará presente a sua infidelidade aos parceiros, o cônjuge e Jesus. Quando
um deles, impacientando-se, se exasperar, fá-lo contra o cônjuge e contra
Jesus.
Beijam-se apenas após beijarem as alianças e beijarem
o Crucifixo, assumindo em parceria a Cruz da vida em comum, com as suas
alegrias e tristezas, momentos de felicidade e de dor.
Juntos, de joelhos, diante do Crucifixo encontram o
Conselheiro Conjugal, o Psicólogo, o Advogado, nos momentos de dificuldade e de
maior dificuldade em compreender ou ser paciente.
Juntos, de joelhos, diante do Crucifixo darão graças
pelos momentos de felicidade que ao logo da vida e de cada ano vão ocorrendo.
Juntos, de joelhos, diante do Crucifixo serão
testemunho de Vida para os filhos da sua união.
Entre nós, desenvolveu-se e quase morreu um costume
idêntico. A consagração dos lares ao Sagrado Coração de Jesus. Pode realizar-se
por alturas do casamento, ou em qualquer momento. Trata-se de obter uma imagem
do Sagrado Coração de Jesus e afixá-la na casa num local de fácil acesso e bem
visível, tanto para os seus ocupantes, como pelas visitas. Existe uma fórmula
para fazer a consagração do lar que pode ser feita por um ministro da Igreja. E
pode usar-se água benta para benzer a casa e as pessoas que lá vivem. Na impossibilidade,
as próprias pessoas podem fazer a consagração. É fácil obter a respectiva
fórmula.
Outras famílias têm feito a consagração do seu lar a
Maria, Mãe de Deus. Que é uma forma de consagração a Deus, invocando a mediação
da sua Mãe.
As vantagens e virtudes de trazer Deus, de qualquer
modo, de modo bem visível, para dentro do casal, do lar e da família não são sensíveis
de um dia para o outro, bem pelo contrário. Ao longo da vida, do amadurecimento
dos pais, do crescimento dos filhos e do envelhecimento das pessoas, vai-se descobrindo
a felicidade da força que ajuda a ultrapassar os momentos mais difíceis e a dirigir
louvores a Deus nas ocasiões de maior alegria.
Não se sente a presença de Deus como passe de magia. Deus
vai entranhando-se cada vez mais dentro de nós, de tal modo que, mesmo nos
quisessem convencer a expulsá-lo, não poderíamos, porque ele já está entranhado
no nosso ser e na essência da família e do lar. E fica em herança para os
nossos filhos.
Orlando de Carvalho
Sem comentários:
Enviar um comentário