Há tantos fiéis, gente piedosa, praticante da caridade e
temente a Deus, que não lê a Bíblia, outras que nunca leram e muitos que nem
sabem sequer como lê-la.
Há tantas pessoas que passam o tempo com a Bíblia na mão,
que decoram frases soltas da Bíblia, a mando de certos chefes religiosos, e que
vivem numa campânula, alheadas da realidade e da Palavra de Deus.
As palavras escritas na Bíblia são importantes, mas apenas
enquanto ferramenta de Deus para fazer chegar até nós a sua Palavra. Quem se
apega à tinta com que foram desenhadas as letras que compõem cada palavra ou
qualquer palavra da Bíblia, não pode chegar a Deus, porque Deus é Amor, Deus
não é tinta de escrever, Deus não é letra, Deus é o Criador.
Altera a vírgula à Palavra de Deus quem a descontextualiza
ou se aproveita de uma má tradução para a manipular a seu favor, porque se a
vírgula lá faltar mas o sentido da Palavra, a exortação à prática contínua e
apaixonada do Amor, se mantiver, não existiu falsificação na Palavra de Deus.
Consultámos os Evangelho, nas suas quatro versões, e procurámos
o nome de qualquer cor. É muitíssimo escassa a citação de cores e nunca se
referem a uma opção.
·
Vermelho
o
Mateus 16,2-3: Jesus refere-se a esta cor para
falar acerca das previsões meteorológicas que os homens fazem, a partir do tom
vermelho do sol.
o
Mateus 27,28.31 e João 19,2.5: Os evangelistas
citam esta cor para definir o manto que, durante a Paixão, vestiram a Jesus
para o torturarem e enfatizarem o sofrimento do Senhor.
·
Verde
o
Lucas 23,31: Jesus para ilustrar uma alusão
escatológica refere diferenças entre a árvore seca e a árvore verde.
·
Preto e branco
o
Mateus 5,36: Há uma referência ao facto de os
cabelos serem brancos ou pretos.
o
Marcos 16,5 e João 20,12: Há uma referência à
cor branca que vestiam as personagens presentes no túmulo vazio.
Também é muito limitado o uso do verbo gostar, no Evangelho.
Encontrámos as citações seguintes e poderão existir mais algumas, mas muito
poucas.
·
Verbo “gostar”
o
Marcos 6,20: Herodes, que mandou matar João
Baptista, gostava dele.
o
Mateus 6,5 e Mateus 23,6-7 e Marcos 12,38-39 e
Lucas 20,46: São várias alusões que Jesus faz aos que gostam de se
evidenciar, criticando esta atitude.
Suponhamos agora que existia no Evangelho um relato em que
Jesus declarava, durante uma refeição que não gostava de alperces. Isso acabaria
por se transformar numa espécie de maldição para essa fruta. Escrever-se-iam
talvez tratados sobre os malefícios dos alperces. Quem sabe quantos não teriam
experimentado a fogueira durante a Idade Média por comerem alperces. Até o
número 13 virou azarado depois da Última Ceia! Quantas vezes não foi necessário
arranjar um décimo quarto conviva ou sentar um dos treze presentes, normalmente
uma criança, numa mesa à parte para evitar o azar de se reunirem treze pessoas à
mesa?
Esta prudência de evitar más interpretações que está
presente em todas as versões evangélicas não pode ser atribuída aos seus
autores, não é crível que pudessem fazer tamanha antecipação no tempo. O texto
evangélico é, de facto, inspirado pelo Espírito Santo e nele está presente a
precaução de não levar as pessoas à confusão. Ainda assim, são muitos aqueles
que tomam a parte pelo todo e os que se obstinam em tomar a tinta com que se
escreve pela real Palavra de Deus. É desta forma que nasce grande parte das
seitas e de comunidades que vivem erroneamente a revelação de Deus.
A mensagem do Evangelho é só uma: Amor. Só amando podemos
entrar na intimidade de Deus. Tudo o mais é futilidade, frivolidade, pueril.
Já sabemos que a Porta é estreita, portanto, se pretendermos
mesmo entrar, despojemo-nos de todos os anéis, de preconceitos, não inchemos o
cérebro com invenções humanas, mas atendamos apenas às recomendações de Deus,
porque elas nos encherão do próprio Deus que se nos dá e nos enche, como que
repartindo connosco a sua divindade.
É Deus quem abençoa, é Deus quem salva. Vestes e regras sem
fim atrapalham e não procedem de Deus, porque Deus é humilde e simples, ajoelha
diante de nós e lava-nos os pés. Isso nos devia bastar, isso devia ser a grande
causa da nossa alegria, ensinar isso aos outros devia ser o nosso ímpeto.
Orlando de Carvalho