sexta-feira, 27 de junho de 2014

A Solenidade do Sagrado Coração


Solenidade do Sagrado Coração é uma festa de origem relativamente recente, ainda que a ideia subjacente seja muito antiga, e tenha inclusive as suas raízes na Sagrada Escritura, uma vez que celebramos o Amor de Deus revelado em Cristo e manifestado sobretudo na Sua Paixão.
O símbolo desse amor, é o Coração de Cristo, ferido pelos nossos pecados.
A monja Juliana Mont Cornillon, foi o instrumento de Deus para promover o estabelecimento da festa em honra da Eucaristia. Foi igualmente uma monja, Margarita Maria Alacoque, da ordem da Visitação, em França, quem impulsionou a ideia que cristalizaria numa nova festa no Calendário.
Entre 1673 e 1675, teve Santa Margarida Maria, no seu convento de Paray-le-Monial, uma série de visões em que Cristo lhe falou, pedindo-lhe que trabalhasse pela instituição de uma festa do Sagrado Coração, que deveria celebrar-se na sexta-feira depois da oitava do Corpo de Cristo.
Roma age lentamente, e por isso passaram quase cem anos, até que a Santa Sé autorizasse os Bispos polacos e a Romana Arquiconfraria do Sagrado Coração, a celebrar a dita festa. Somente em 1956, o Papa Pio IX a estendeu a toda a Igreja.
Nos anos seguintes, a festa cresceu em importância, assim como em popularidade. A Liturgia das Horas e a Missa desta festa, sofreram várias alterações. A que se levou a efeito sob a direcção de Pio XI, esteve em vigor desde 1928 até 1968. O Breviário Romano e o Missal, revistos de acordo com os princípios do Concílio do Vaticano II, foram o último passo na liturgia desta festa. O Leccionário da Missa, oferece-nos a mais ampla selecção de leituras, baseadas no sistema dos três Ciclos Litúrgicos.

O Significado da Festa

A devoção ao Sagrado Coração é a devoção ao próprio Cristo. Nas representações artísticas, não é possível mostrar apenas o coração. Há que representar Cristo na Sua Humanidade completa, porque Ele é o objecto da nossa adoração e para Ele se dirige a nossa oração. “Vinde adoremos o Coração de Jesus, ferido por nosso amor”.
Quando falamos do Coração de Jesus ou de um coração humano, que queremos dizer? - Referimo-nos a um órgão humano ou a uma metáfora?
Isso depende do contexto do nosso discurso, mas, segundo Karl Rahner num reflexão filosófica sobre o tema “coração”, é um desses termos primordiais que encerram um rico significado e valor e apontam para um mundo de realidades.
O coração representa o ser humano na sua totalidade. É o centro original da pessoa humana, o que lhe dá unidade. O poeta Yeats falou do “núcleo profundo do coração”.
O coração é o centro do nosso ser, a fonte da nossa personalidade, o motivo principal das nossas atitudes e escolhas livres, o lugar da misteriosa acção de Deus.
Apesar de nas profundezas do coração poder existir o bem e o mal, o coração é símbolo do amor. Segundo Rahner, a mais íntima essência da realidade pessoal é o amor.
E uma vez que Cristo é o Perfeito Amor, o Seu Coração é para nós o sinal perfeito do amor, o Seu Coração sempre cheio de amor ao Pai e aos homens.
Nós só entenderemos o que é o amor, tentando compreender alguma coisa do amor de Cristo. O Seu amor é totalmente, mas não somente humano, porque n’Ele nos encontramos com o mistério de um amor humano-divino. O Coração humano de Cristo está hipostaticamente unido à Sua Divindade. O Amor de Deus, incarnou no Amor humano de Cristo.
O Amor de Deus para com o homem, existe desde toda a eternidade. Os textos do Antigo Testamento, estão cheio desta evidência. “Amei-te com um amor eterno”, declara Yavé ao seu povo por meio do profeta Jeremias (Jer 31,2). A liturgia desta festa foi retirada dos seguintes textos:
A Antífona da entrada da Missa é o Salmo 32: “Os projectos do coração do Senhor, subsistem de geração em geração, para libertar as vidas dos seus fiéis da morte e alimentá-los no tempo da fome”. A resposta ao Salmo Responsorial é a seguinte: “A bondade do Senhor permanece eternamente sobre aqueles que O amam”. As leituras do Antigo Testamento para os três Ciclos, proclamam o amor de Deus para com o seu Povo, demonstrando como o escolheu e o salvou, estabeleceu com ele um pacto, conduziu-o com suavidade e amor e foi para ele um bom pastor.
Se o Antigo Testamento já revela o grande Coração de Deus, o Novo Testamento manifesta-o completamente. São João, arauto da Encarnação e do Amor de Deus, apenas consegue exclamar: “Tanto amou Deus o mundo, que lhe entregou o seu Filho Unigénito”(Jo 3,16).
O amor de Cristo ao Pai e ao homem caído, a quem veio salvar, vai levá-Lo à morte, e uma morte na cruz. Ele mesmo declarou: “Ninguém tem maior amor, do que aquele que dá a vida pelos seus amigos”(Jo 15,13).
O sofrimento e a morte na cruz de Jesus, são uma amostra do seu amor por nós. São Paulo maravilhava-se frequentemente pensando nisso: “Mas é assim que Deus demonstra o seu amor para connosco: quando éramos ainda pecadores é que Cristo morreu por nós.”(Rm 5,8).
São Paulo experimentou esse amor num nível profundamente pessoal “Já não sou eu que vivo, mas é Cristo que vive em mim. E a vida que agora tenho na carne, vivo-a na fé do Filho de Deus que me amou e a Si mesmo Se entregou por mim”(Gl 2,20).
A contemplação deste mistério deveria levar-nos a uma múltipla resposta. Deveria suscitar em nós sentimentos de fé, amor e adoração.
Também de compaixão? - Também ela tem a sua parte na nossa devoção, desde que com isso não esqueçamos que Jesus Cristo, agora na Sua Glória, não pode sofrer. Mas o pensamento do muito que padeceu às mãos dos homens, pode suscitar sentimentos de compaixão.
Compadecer-se de Cristo nos seus sofrimentos e tristezas, não é um fenómeno moderno. Faz parte da piedade cristã desde tempos muito remotos, e alcançou a sua expressão máxima na Idade Média. A compaixão não está totalmente ausente da liturgia. Encontra-se de forma discreta, mas inconfundível, nas celebrações da Semana Santa, por exemplo nos “impropérios” de Sexta-feira Santa: “Meu povo, que te fiz eu…”?
Certamente, a meditação dos sofrimentos de Cristo deveria suscitar em nós a dor dos pecados, dos nossos próprios pecados e dos pecados do mundo. Mas deve também haver alegria, alegria de saber que somos amados e que foi o amor que triunfou.
Porém, a nossa devoção não deve permanecer apenas ao nível do sentimento. A palavra latina devotio, tem muito mais força que as equivalentes nas línguas actuais.
No contexto religioso, indica serviço dedicado e vontade decidida de fazer a vontade de Deus. Sugere culto não apenas de tipo litúrgico, mas da totalidade das nossas vidas.
Esta devoção realiza-se aceitando o desafio de Cristo, para que tomemos a nossa cruz e O sigamos. A Igreja e os seus membros individualmente, devem completar de uma maneira misteriosa, o que falta aos sofrimentos de Cristo.
Todos nós temos o privilégio de fazer parte da obra redentora de Jesus. Como observa Rahner: “Para nós, que participamos no destino do seu amor no mundo, é-nos permitido e, somos encorajados a continuar a paixão e morto no Corpo Místico da Igreja, até ao fim dos tempos ”.

Raízes Bíblicas e Litúrgicas

O Papa Pio XII, na sua Encíclica Haurietis aquas, sobre a devoção ao Sagrado Coração de Jesus, publicada em 1956 preocupou-se em fundamentar esta devoção nas suas fontes bíblicas. A citada Encíclica é um documento importante, em que se inspirou a Missa e o Ofício da festa actuais. Também serviu de estímulo ao famoso historiador monástico Dom Jean Leclercq para traçar, num artigo escrito há anos, o desenvolvimento desta devoção desde os seus inícios, até aos nossos dias. As ideias que oferecemos nestes apontamentos, foram tomadas a partir do citado artigo.
A devoção ao Sagrado Coração de Jesus, tem a sua origem em dois textos do Novo Testamento, ambos do Evangelho de São João. O primeiro em (Jo 7,37-38): “Se alguém tem sede, venha a Mim; e quem crê em Mim que sacie a sua sede! Como diz a Escritura, hão-de correr do seu coração rios de água viva”.
Os estudiosos concordam que é uma referência ao Coração de Cristo. Para os crentes é uma fonte inesgotável de vida e benção. Esta passagem assemelha-se mais a outro texto que se encontra no final do Evangelho de São João, que recorda o misterioso facto que aconteceu depois da crucifixão (Jo 19,33-34) “Mas ao chegarem a Jesus, vendo que já se encontrava morto, não Lhe quebraram as pernas. Porém um dos soldados abriu-Lhe o peito com uma lança e logo brotou sangue e água”.
Na tradição cristã, o sangue foi interpretado como símbolo do sacrifício e do mistério eucarístico. A água simboliza o Espírito Santo, que brota de Cristo para a Igreja.
A devoção ao Sagrado Coração de Jesus, surgiu da meditação desses textos. Com o passar dos séculos, a atenção centrou-se no Coração de Jesus em vez do lado ferido, mas o mistério subjacente continua a ser o mesmo.
Os textos citados acima, colocam a festa do Coração de Jesus, no contexto da Semana Santa, concretamente em Sexta-feira Santa. Como observa o padre Plácido Murray, “a liturgia é um facto de Sexta-feira Santa, uma chama a interiorizar o culto”. O amor é a chave da Semana Santa e é ao mesmo tempo, a mensagem principal desta festa.
Na passagem do capítulo sétimo de São João, Jesus alude à profecia de Ezequiel (Ez 47), que anuncia a água viva que brota do Templo. Cristo é o cumprimento daquela profecia, o verdadeiro templo de onde brota o Espírito: “D’Ele brota sangue e água, a graça e os sacramentos; D’Ele nasce o mistério da Igreja, a salvação dos homens”.
A Liturgia relaciona estes textos não apenas com a Paixão, mas também com a Ressurreição. Já vimos como a passagem de Ezequiel é evocada durante o Tempo Pascal, no rito da benção da água e da aspersão no começo da Missa: “Vi que manava água do lado direito do templo. Aleluia. E haverá vida onde quer que chegue a corrente e cantarão, Aleluia, Aleluia”.
A antífona IV alternativa, deixa claro que esta profecia se cumpre no Calvário: “Do teu lado ó Cristo, sairá uma fonte de água viva, que limpa o mundo do pecado e renova a vida. Aleluia”.
Durante a Idade Média, a devoção ao Sagrado Coração, manteve a sua relação com o Mistério Pascal, com a Bíblia e a Liturgia. Assim o afirma Dom Leclerque, que nos diz que “consistia em aderir-se ao mistério da paixão de Cristo e à sua vitória e Ressurreição, por meio de uma fé confiante, uma vez que a sua morte e triunfo, revelaram, precisamente o amor”.
A ternura desta devoção está bem expressa nas palavras de um escrito medieval, Arnoldo de Bonneval: “Que doçura nesta abertura do seu peito! Ela revelou-nos os tesouros da bondade de Jesus, o amor que o seu coração tem para connosco”.

A Liturgia

É mais que tempo de analisarmos mais de perto os textos da Liturgia, que incluem algumas das passagens mais consoladoras do Antigo e do Novo Testamento. Para além dos textos da Escritura, temos as composições da própria Igreja, inspiradas pela Palavra de Deus e pela Tradição. Há uma grande riqueza de material para meditar e procurarmos inspiração.
O primeiro texto que iremos ter em consideração é o do ofício de Leituras, e pertence ao capítulo oitavo da carta de São Paulo aos Romanos. Ele dá-nos o título apropriado: “O amor de Deus manifesta-se em Cristo”. O Apóstolo é aqui do mais eloquente ao proclamar esse amor, de que fala com a experiência que lhe dá o tê-lo experimentado inclusive, em momentos de grandes dificuldades pessoais: “Quem me poderá separar do amor de Cristo?” E responde que nem sequer a morte, porque o amor de Cristo triunfou.
Vejamos agora o Leccionário da Missa com as suas leituras para os três Ciclos Litúrgicos. Já nos referimos anteriormente às três leituras do Antigo Testamento, que descobrem o amor de Deus. Mas ficaram por examinar as do Novo Testamento. No Ano A, é São João quem se dirige a nós (Jo 4, 7-16). A sua mensagem indica que o amor de Deus nos foi revelado quando enviou o Seu Filho ao mundo, para ser o sacrifício que tira os nossos pecados. No final da leitura, São João faz a tremenda afirmação: “Deus é amor
No Ano B, a segunda leitura é da Carta aos Efésios (Ef 3, 8-19). São Paulo afirma de si mesmo, que é o arauto do amor de Deus. Este amor vai-se desenrolando ao longo da história, num plano cuidadosamente levado a cabo e que alcança o seu ponto culminante em Cristo. A sua tarefa como Apóstolo, consiste em proclamar “o infinito tesouro de Cristo”.
A segunda parte da leitura, é uma fervorosa oração, para que os seguidores de Cristo cresçam fortes na fé e no amor, e que cheguem a um maior conhecimento do amor de Cristo, que é um mistério que ultrapassa a compreensão humana.
O amor de Cristo não está exclusivamente reservado para uma elite. Abraça todos os homens, mesmo aqueles mais rebeldes e até tem uma especial predileção e afecto, pelos pecadores. Esta verdade está maravilhosamente expressa na parábola do Bom Pastor. É significativo que esta parábola, na terna versão de São Lucas (Lc 15,3-7), foi escolhida como leitura evangélica para o Ano C. O Bom Pastor deixa o seu rebanho no redil, para ir procurar a ovelha perdida, e quando a encontra, leva-a para o redil, carregando-a sobre os seus ombros. E então alegra-se com os seus amigos por tê-la encontrado. Assim haverá grande alegria no céu por um pecador que se arrepende.
Há vários textos que chamam a nossa atenção sobre o peito trespassado de Cristo. A leitura evangélica para o Ano B, fala-nos precisamente dessa facto descrito por João (Jo 19, 31-37), que poderia ser o texto fundamental para a festa, e cujo simbolismo já foi comentado. No Ofício de Leituras, São Boaventura comunica a sua compreensão desse mistério “Para que do lado de Cristo morto na cruz se formasse a Igreja e se cumprisse a palavra da Escritura que diz: Hão-de olhar para Aquele que trespassaram, a divina providência permitiu que um dos soldados Lhe abrisse com a lança o lado sacrossanto e dele fizesse brotar sangue e água. Este é o preço da nossa salvação, saído daquela divina fonte, isto é, do íntimo do seu Coração, para dar aos sacramentos da Igreja o poder de conferir a vida da graça e se tornar para aqueles que vivem em Cristo uma fonte de água viva que jorra para a vida eterna”.
Para a Oração Colecta, o Missal propõe duas opções. A primeira refere-se ao Coração de Cristo como fonte de toda a graça e benção, recorda e alegra-se com os benefícios do seu amor por nós, e conclui pedindo: “Dá-nos desta fonte divina uma inesgotável abundância de graça”. A segunda Oração, que é a que se usava antes, vê neste Coração, ferido pelos nossos pecados, o receptáculo dos infinitos tesouros do amor de Cristo.
O Prefácio reúne as várias ideias: o Calvário, o peito trespassado e o Coração aberto, e celebra o amor de Cristo, que não cessa de arder por amor à humanidade.
Elevado sobre a cruz, fez brotar da ferida do seu lado, com a água e o sangue, os sacramentos da Igreja: para que assim, aproximando-se do Coração do Salvador, todos possam beber com alegria das fonte da salvação.
Encontramos aqui de novo o Mistério Pascal. Uma vez mais se recorda a proclamação da Páscoa: “Tirareis água com alegria, das fontes de salvação”.

O Amor mútuo

A obrigação de nos amarmos uns aos outros, é a conclusão do mistério que celebramos. São João afirma claramente (1 Jo 4,11-22): “Caríssimos, se Deus nos amou assim, também nós devemos amar-nos uns aos outros. A Deus nunca ninguém O viu: se nos amarmos uns aos ouros, Deus permanece em nós e o seu amor chegou à perfeição em nós ”. Esta passagem é da primeira leitura do Ano A. A leitura evangélica deste mesmo dia, é o capítulo décimo primeiro de Mateus (Mt 11 25-30), e convida-nos a olhar a Cristo e a aprender do seu exemplo: “Aprendei de Mim que sou manso e humilde de coração, e encontrareis alívio para o vosso espírito…”. O amor cristão pode ter várias formas, mas quanto mais se aproxime de Cristo, mais irá adquirindo o selo da mansidão: “Bem-aventurados os mansos”.
Hoje sublinhámos com razão, a dimensão horizontal da religião. A justiça social é reconhecida como um elemento essencial do cristianismo. O amor não compatível com a indiferença, perante a manifesta injustiça social. Mas as actividades politicas e sociais, devem ser animadas pelo amor cristão.
Cristo deve viver no crente pela fé e o amor. Devemos ter a mentalidade de Cristo e deixar-nos mover pelo Espírito. “Plantados e construídos sobre o amor”, é o princípio no qual se deve basear a acção social cristã.
Tudo isso está de harmonia com a devoção ao Coração de Jesus, mas convém que hoje ponhamos um acento especial nestas coisas. Temo-lo explícito nas leituras da Bíblia, e apenas é necessário explica-lo e expô-lo na meditação.
Expressa-se nas orações colecta da Missa e numa das intercessões das preces de Laudes, dirigida expressamente a Cristo: “Jesus Cristo, fonte de vida e santidade, - fazei-nos santos e irrepreensíveis na caridade”.
A comunhão sacramental não é apenas o participar no Corpo e no Sangue de Cristo. Implica, para além disso, participação na vida dos seus membros, com um compromisso de amor e de serviço. Esta é a ideia que expressa a oração pós-comunhão: “Este sacramento do Teu amor, Senhor nosso Deus, acenda em nós o fogo da caridade, que nos mova a unirmo-nos mais a Cristo e a reconhecê-Lo presente nos irmãos”.
O latim usa a palavra attrahere, no sentido de sermos atraídos para o Coração aberto do Salvador, e inspira-se nas próprias palavras do Senhor: “E Eu, quando for levantado da terra, atrairei todos a Mim”(Jo 12,32).
Ser atraídos para Jesus, para o Seu Coração, não significa ser afastados dos nossos irmãos. É sim para os encontrar no Coração de Cristo, para os amar “nas entranhas de Cristo Jesus”.

Magistério Papal recente

Desde que o Papa Pio XII publicou a sua Encíclica Haurietis aquas, vários dos seus sucessores trataram do culto ao Sagrado Coração de Jesus. O Papa Paulo VI, na sua carta Apostólica Las innumerables riquezas de Cristo (6 de Fevereiro de 1965), recomendava esta devoção como um meio excelente de honrar o próprio Jesus, e fazia notar a relação íntima entre esta devoção e o Mistério Eucarístico: “Desejamos especialmente que o Coração de Jesus seja honrado por uma participação mais intensa no Sacramento do Altar, uma vez que o maior dos seus dons é a Eucaristia”.
Paulo VI contava esta devoção entre as fórmulas populares de piedade que o Concílio do Vaticano II queria promover, porque estava para além disso, em harmonia com a Liturgia, porque precisamente no Coração de Jesus, tem a Liturgia a sua origem e a sua vida. A partir desse Coração, o sacrifício de expiação elevou-se até ao Pai Eterno.
João Paulo II, na sua primeira Encíclica, Redemptor hominis (4 de Março de 1979), que trata do Mistério da Redenção, tem a seguinte expressão: “A Redenção do mundo - este tremendo mistério de amor, no qual a criação se renova - tem na sua raiz mais profunda a plenitude da justiça no coração humano, o coração do Filho Primogénito, para que possa haver justiça no coração de muitos seres humanos, predestinados desde a eternidade no Filho Primogénito a serem filhos de Deus e chamados à graça e ao amor”.
Numa audiência geral, em 20 de Junho do mesmo ano, o Santo Padre falou abundantemente da devoção ao Sagrado Coração, cuja festa estava prestes a ocorrer: “Hoje, antecipando a festa desse dia, juntamente convosco, desejo voltar os olhos dos nossos corações, para o mistério desse Coração. Prendeu-me desde a minha juventude. Em cada ano volto a este mistério ao ritmo litúrgico da Igreja”.
É característica do Papa João Paulo, falar do Coração de Cristo associando-O com todo o coração humano. É um caso de “cor ad cor loquitur”, “o coração fala ao coração”. O coração é o símbolo que fala do homem interior e espiritual. O coração humano iluminado pela graça, é chamado a compreender as “inumeráveis riquezas” do Coração de Cristo.
São João, o Apóstolo, São Paulo e os místicos de todos os tempos, descobriram por si mesmos e partilharam com outros essas mesmas riquezas espirituais. Mas Jesus atrai a todos para o Seu Coração, revela-Se a eles, fala-lhes ao coração, vive nos seus corações pela fé e quer ser rei deles, não pelo exercício da força, mas com a suavidade e amor.
Por fim, numa nota litúrgica, o Papa explica esta festa e resume o Ciclo Litúrgico: “Assim, no final deste ciclo fundamental da Igreja, a festa do Sagrado Coração de Jesus apresenta-se discretamente. Todo o ciclo está definitivamente nele: no Coração do Homem Deus. D’Ele irradia também a cada ano, a vida inteira da Igreja”.

Encuentra/Vincent Ryan (Páscoa, Festas do Senhor. Paulinas, Madrid – 1987, pag 118-132)
Tradução livre de Diácono Maximino A. Martins



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