Temos insistido, desde há muito tempo, no engano que muitas
vezes são as comemorações. De que serve comemorar o aniversário de alguém de
quem eu falo mal nas costas? De que serve dar prendas de aniversário a alguém
que eu trato mal? De que serve levar flores ao funeral de alguém que não
respeitei em vida? De que serve ser bom para os pobres no Natal e evitá-los
durante o resto do ano?
De que serve comemorar o Advento, celebrando-o se não viver
de acordo com essa opção?
O Advento é um tempo de preparação para o encontro com Jesus
no final do nosso tempo na Terra e para a comemoração da primeira vinda do
Filho de Deus, há dois mil anos. Se cumpro o tempo de Advento com muitas rezas,
muitas leituras e reflexões e isso não se torna visível na minha vida, se morro
durante ou fora do Advento, e apenas tenho para levar ao encontro do Senhor a
vergonha do que foi a minha vida, para que serviu o tempo perdido na
comemoração do Advento. Afinal, eu dizia que me estava a preparar, mas era
apenas garganta.
O texto que a seguir reproduzimos é da autoria de Jorge
Almeida, visitador e ministro extraordinário da comunhão na altura dos
acontecimentos, corria o ano de 2001, no Hospital Curry Cabral. Seremos eternamente
gratos pelas suas doces palavras que de algum modo foram bálsamo para a nossa
dor.
É noite. E como todas as noites ao rezar o terço em família, peço a
Maria, Nossa Mãe, que interceda junto do seu Filho, Jesus Cristo, que nunca
hesitou em aliviar as doenças e enfermidades daqueles que Lho pediam, por todos
os doentes, especialmente pelos que visito. Um a um, todos vão passando na
minha mente duma maneira muito viva. Mencionando os seus nomes, recordo o seu
sofrimento.
O hospital é um lugar privilegiado para testemunhar a bondade, o
altruísmo, a sensibilidade.
É isso que quero fazer hoje. Hoje, lembro-me muito em especial duma
jovem doente, a quem chamarei Maria.
Maria faz no hospital 26 anos. Festeja-os rodeada do carinho de
seus familiares e confessa-me que nesse dia se sente particularmente feliz. Perto
dela, sinto a presença do Deus do Amor, da Bondade e da Ternura. Esse Amor que
se revela e contagia todos os que com ela privam, médicos, enfermeiras e outro
pessoal. Nunca se queixa, apesar da grave doença que a afecta há já 18 anos. Tem
sempre uma palavra de encorajamento para os outros doentes, comentando que
alguns estarão bem pior que ela.
Pertence a uma família profundamente católica que a rodeia cheia de
carinho.
Perto dela redescubro e sinto reforçada a minha fé neste Deus da
Vida e do Amor que caminha connosco e dá sentido e profundidade ao nosso
quotidiano.
No Hospital é-lhe prestada assistência espiritual, através da
Capelania, comungando diariamente. Encontramo-la rezando com outros doentes e
muito preocupada com o trabalho e sacrifício que está a causar a toda a
família.
Numa madrugada de terça-feira, depois de perguntar a uma
funcionária do hospital que se encontrava junto dela, se sabia orar, diz-lhe
serenamente: - então reze comigo, por mim e pelos outros.
Fico a pensar no Cristo que está em cada doente e sofre com ele. Nesse
Cristo que nasceu, sofreu, morreu e ressuscitou por nós. “Vinde a mim vós que estais cansados e de coração oprimido e Eu vos
aliviarei”.
Maria não sofre mais!
Jesus Cristo continua a nascer, a sofrer, a morrer e a ressuscitar
em nós e connosco!
Comemoremos e celebremos o Advento, mas apenas na medida em que
sirva para o vivermos em cada dia da nossa vida. Que vivamos em cada dia um dia
de Advento, preparando o encontro com o Senhor que pode chegar em qualquer
terça-feira ou noutro dia qualquer.
Um modo simples de prepararmos esse encontro é, perante o
perigo, a dor, o sofrimento, invocar a ajuda de Deus, rezar serenamente, em vez
de gritar toda a ira e as imprecações que em nada aliviam a alma, nem aportam
felicidade.
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