Em 25 de Setembro de 2003, o Público, trazia este artigo, que reproduzimos, sobre o qual é
oportuno reflectir, passados que são 15 anos. A controvérsia mantém-se e alguns
dos protagonistas são os mesmos.
"Espero que não vá para a frente, seria um pontapé daqueles
fortes." O comentário é do padre Alfredo Neres, 64 anos, que desde 1990
está no Congo como missionário, e refere-se ao documento que está a ser
estudado no Vaticano e que prevê, entre outras coisas, a interdição de aplausos
e danças nas missas, e a impossibilidade de as raparigas serem acólitas
(ajudantes do padre na celebração).
A reacção de Alfredo Neres, membro dos Missionários Combonianos, sintetiza o tom das opiniões ouvidas pelo PÚBLICO. Mas nem todos alinham pelo diapasão das críticas à proposta de texto. O padre Alberto Gomes, 40 anos, responsável nacional do Serviço de Acólitos, diz que o documento não vem alterar grande coisa do que já acontece, por exemplo em relação à possibilidade de raparigas serem acólitas. "As normas existentes falam na necessidade de haver razões pastorais." Por isso, o conteúdo do novo texto - se vingar o que já é conhecido - "não altera" o que existe.
Alberto Gomes diz que haverá uns 20 mil acólitos e acólitas em Portugal. "Os rapazes ainda têm um peso preponderante", diz. Não é o caso em Vila Franca de Xira. O pároco desta cidade, Vítor Gonçalves, 37 anos, tem três dezenas de acólitos, metade de cada sexo, entre os 10 e os 32 anos. Na paróquia desde 1996, Vítor Gonçalves diz que já encontrou o grupo misto "a funcionar bem". Uma reunião mensal, a preparação de actos que requerem mais exigência e a formação cristã em sentido lato - "não só litúrgica" - são algumas das componentes da vida desse grupo, que tem uma "identidade própria, mas não funciona como grupo fechado". "O estímulo mútuo e o convívio" são duas dimensões destacadas por este pároco.
"Não há motivo para se voltar atrás", diz Vítor Gonçalves, a propósito da proposta em estudo. A mesma opinião tem José Manuel Marques Pereira, responsável do Secretariado Diocesano de Liturgia, de Aveiro. "Quando se fala de igualdade entre homens e mulheres, não faria sentido uma decisão destas." Na diocese de Aveiro, onde existem algumas centenas de acólitos - as raparigas e mulheres serão metade -, este responsável nota que "elas são mais fiéis" neste serviço: "Os rapazes, como têm que pôr a veste, são muitas vezes ridicularizados na escola e ficam envergonhados. As raparigas não." O padre Marques Pereira acrescenta que não se pode querer as mulheres "apenas para lavar panos".
Missas com danças
"Se tirarmos as mulheres da catequese, das leituras, de andar perto do altar, a Igreja fica vazia", alerta o padre José da Lapa, 77 anos, responsável em Portugal do Renovamento Carismático Católico (RCC). O padre Lapa não resiste a comentar a questão das acólitas, mas fica preocupado com um dos outros temas abordados no esboço do documento: o RCC privilegia a celebração da missa com muitos cânticos, palmas, e mesmo danças - que passarão a estar interditas se a formulação inicial vingar.
"Se Jesus foi aplaudido em Jerusalém, porque havemos de ter missas que tantas vezes parecem velórios?", pergunta. "Na missa carismática predomina a alegria, às vezes há exageros, mas o mínimo de manifestação exterior é fundamental." Introdutor do RCC em Portugal, em Novembro de 1974, José da Lapa não acredita que o Papa deixe passar o documento.
Em África, a dança tem um lugar vital nas celebrações. O missionário Alfredo Neres diz que as celebrações "não têm sentido sem o canto e dança". "Toda a gente dança, a vida africana sem a dança não tem sentido", diz. De tal modo que, em 1990, a Santa Sé aprovou um ritual próprio para a liturgia zairense - e que já está a ser adoptado em outros países africanos. "Seria muito mal visto" o Vaticano acabar com esta realidade, diz o padre. Que acrescenta, sobre a questão das mulheres, não haver "reserva cultural" à presença do sexo feminino em lugares de destaque na celebração.
O padre Alberto Gomes está confiante que o Vaticano admita excepções para casos como os dos carismáticos ou as liturgias africanas. "É impossível acabar" com a dança na missa em África, diz, e "é natural que haja excepções" para casos como esse. Mas acha que muitos colegas seus impõem o seu modo de pensar às pessoas: "Vi recentemente uma missa [em Portugal] com canto africano, sem sentido nenhum, mas com o padre a achar que era bonito. É preciso chamar a atenção para aspectos destes e é importante saber que se vai à missa e não a outra coisa."
O padre José Manuel Marques Pereira não hesita num alerta: "Se o Vaticano chama a atenção para que haja cuidado, acho bem. Se há abusos, que se identifiquem os abusos. Mas entrar numa linguagem de condenação e proibição, é um exagero para estes tempos."
A reacção de Alfredo Neres, membro dos Missionários Combonianos, sintetiza o tom das opiniões ouvidas pelo PÚBLICO. Mas nem todos alinham pelo diapasão das críticas à proposta de texto. O padre Alberto Gomes, 40 anos, responsável nacional do Serviço de Acólitos, diz que o documento não vem alterar grande coisa do que já acontece, por exemplo em relação à possibilidade de raparigas serem acólitas. "As normas existentes falam na necessidade de haver razões pastorais." Por isso, o conteúdo do novo texto - se vingar o que já é conhecido - "não altera" o que existe.
Alberto Gomes diz que haverá uns 20 mil acólitos e acólitas em Portugal. "Os rapazes ainda têm um peso preponderante", diz. Não é o caso em Vila Franca de Xira. O pároco desta cidade, Vítor Gonçalves, 37 anos, tem três dezenas de acólitos, metade de cada sexo, entre os 10 e os 32 anos. Na paróquia desde 1996, Vítor Gonçalves diz que já encontrou o grupo misto "a funcionar bem". Uma reunião mensal, a preparação de actos que requerem mais exigência e a formação cristã em sentido lato - "não só litúrgica" - são algumas das componentes da vida desse grupo, que tem uma "identidade própria, mas não funciona como grupo fechado". "O estímulo mútuo e o convívio" são duas dimensões destacadas por este pároco.
"Não há motivo para se voltar atrás", diz Vítor Gonçalves, a propósito da proposta em estudo. A mesma opinião tem José Manuel Marques Pereira, responsável do Secretariado Diocesano de Liturgia, de Aveiro. "Quando se fala de igualdade entre homens e mulheres, não faria sentido uma decisão destas." Na diocese de Aveiro, onde existem algumas centenas de acólitos - as raparigas e mulheres serão metade -, este responsável nota que "elas são mais fiéis" neste serviço: "Os rapazes, como têm que pôr a veste, são muitas vezes ridicularizados na escola e ficam envergonhados. As raparigas não." O padre Marques Pereira acrescenta que não se pode querer as mulheres "apenas para lavar panos".
Missas com danças
"Se tirarmos as mulheres da catequese, das leituras, de andar perto do altar, a Igreja fica vazia", alerta o padre José da Lapa, 77 anos, responsável em Portugal do Renovamento Carismático Católico (RCC). O padre Lapa não resiste a comentar a questão das acólitas, mas fica preocupado com um dos outros temas abordados no esboço do documento: o RCC privilegia a celebração da missa com muitos cânticos, palmas, e mesmo danças - que passarão a estar interditas se a formulação inicial vingar.
"Se Jesus foi aplaudido em Jerusalém, porque havemos de ter missas que tantas vezes parecem velórios?", pergunta. "Na missa carismática predomina a alegria, às vezes há exageros, mas o mínimo de manifestação exterior é fundamental." Introdutor do RCC em Portugal, em Novembro de 1974, José da Lapa não acredita que o Papa deixe passar o documento.
Em África, a dança tem um lugar vital nas celebrações. O missionário Alfredo Neres diz que as celebrações "não têm sentido sem o canto e dança". "Toda a gente dança, a vida africana sem a dança não tem sentido", diz. De tal modo que, em 1990, a Santa Sé aprovou um ritual próprio para a liturgia zairense - e que já está a ser adoptado em outros países africanos. "Seria muito mal visto" o Vaticano acabar com esta realidade, diz o padre. Que acrescenta, sobre a questão das mulheres, não haver "reserva cultural" à presença do sexo feminino em lugares de destaque na celebração.
O padre Alberto Gomes está confiante que o Vaticano admita excepções para casos como os dos carismáticos ou as liturgias africanas. "É impossível acabar" com a dança na missa em África, diz, e "é natural que haja excepções" para casos como esse. Mas acha que muitos colegas seus impõem o seu modo de pensar às pessoas: "Vi recentemente uma missa [em Portugal] com canto africano, sem sentido nenhum, mas com o padre a achar que era bonito. É preciso chamar a atenção para aspectos destes e é importante saber que se vai à missa e não a outra coisa."
O padre José Manuel Marques Pereira não hesita num alerta: "Se o Vaticano chama a atenção para que haja cuidado, acho bem. Se há abusos, que se identifiquem os abusos. Mas entrar numa linguagem de condenação e proibição, é um exagero para estes tempos."
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