terça-feira, 5 de janeiro de 2021

Cristo presente na pessoa do presidente da celebração


 Dizia o meu amigo Padre Manuel que a maneira como um sacerdote, e ele em particular, vivia a Eucaristia era diferente e não era compreensível pelos que não são sacerdotes.

Nunca foi uma das suas afirmações que mais me entusiasmaram. Pelo contrário, parecia-me até uma demonstração de algum convencimento que me enervava.

Mas não havia hipótese de entendimento ou acordo, porque ele não explicava, limitando-se a reiterar que a vivência da Eucaristia pelo sacerdote que presidia estava para além do compreensível pelos leigos.

Quero deter-me neste pensamento.

Que pode a Eucaristia significar para o sacerdote?

Uma fonte de poder? Uma demonstração de superioridade? Não deveria antes ser um gesto de humildade? Talvez inclua tudo isso e muitos outros conceitos.

 

Um padre não constitui família, normalmente vive sozinho. Quando na Eucaristia fala e age com a autoridade de Jesus talvez sinta com maior intensidade o laço fraterno que tem com o Filho de Deus. E sei que ele sentia, particularmente na sua pequenez, que tinha uma ligação estreita com Jesus.

O que vou relatar não se trata de invenção do Padre Manuel, mas de algo que está prescrito. Suponhamos que em cima do altar está “outro” vaso com hóstias, num canto, quase dissimulado. Se no momento da consagração, o padre tiver a intenção consagrar esse pão, ele será Corpo de Cristo. Se o padre não der pela sua existência ou não tiver intenção de as consagrar, continuarão a ser pão, simplesmente pão. Ao reiterar esta posição, o Padre Manuel assumia com frontalidade uma relação íntima com Deus, quase de diálogo privado.

 

Até que ponto a espectacularidade de algumas das suas celebrações eram um modo de se evidenciar ou uma forma de glorificar a Deus. Há coisas que nem os próprios conseguem discernir, apenas Deus. Eu que contactei tão de perto com o Padre Manuel nas acções litúrgicas e de evangelização, afirmo que escutei os seus pensamentos, senão os adivinhei mesmo algumas vezes. Creio que a vaidade que tinha no que realizava e em como realizava não punha em causa o reconhecimento da sua condição humana e submissão a Deus. E mesmo à Igreja. A exaltação que a espectacularidade dos seus gestos na liturgia assumia não resultavam em bem próprio, na realidade, mais não eram que modos de evangelização. A exaltação da Santa Missa e das suas partes elevam os fiéis e aproximam Deus.

 

Ele usava várias cordas que podemos todos usar para ascender ao Céu.

A devoção a Nossa Senhora de Fátima

A devoção ao nome de Jesus

A oração diária pelos que venham a morrer nesse dia

O estudo das Escrituras

A preparação cuidada das pregações que fazia nas assembleias eucarísticas

 

Ele viveu tempos de mudança na Igreja, períodos conturbados e de indefinição, em que aquilo era num dia podia já não ser o correcto no outro dia. Tempos aproveitados pelos inimigos da Igreja para afrontarem a fé.

A hierarquia da Igreja não foi capaz de dar a mão e ajudar a caminhar os padres da sua geração com a pedagogia maternal que seria expectável. Mas Deus sabe tudo. Que o Senhor releve os seus pecados, que deverão ser muitos, mais de oitenta anos a pecar, pelo bem que fez no mundo e pelo modo como adorou. Pelas sementes que lançou, pelas que brotaram e floriram e também pelas que caíram nas pedras ou à beira dos caminhos.

A tua pregação não chegava a todos os corações, de modo especial os que em vez de estarem atentos às homilias se queixavam que eram cansativas. Daí, onde estás, intercede por esses e por todos nós.

 

Orlando de Carvalho

 

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